Apenas uma mulher latino-americana, Bruna Ramos da Fonte

por Luciana Biano

Sessenta anos após o golpe militar de 1964, biógrafa e jornalista mergulha no fértil repertório do cancioneiro de protesto. Lançamento no Rio será no dia 18/04.

O golpe de Estado ocorrido no Brasil em 1964 implantou um período ditatorial de vinte e um anos marcado por censura, perseguição política, prisão e tortura. Apoiada pelos Estados Unidos, a tomada de poder pelos militares no país, após a deposição do presidente João Goulart, antecedeu uma série de outros governos autoritários na América Latina, que foram se espalhando rapidamente por países como Bolívia, Argentina, Chile e Uruguai. À medida que o cerco se fechava, muitas vozes no meio musical desses países se engajaram contra o regime e se dedicaram a direcionar a sua criação para a transformação política, econômica, social e cultural da América Latina.

Em Apenas uma mulher latino-americana: em busca da voz revolucionária, lançado pela Rocco nos sessenta anos do golpe militar no Brasil, a jornalista Bruna Ramos da Fonte convida o leitor para uma viagem através da chamada música de protesto (ou revolucionária, como preferia chamar o compositor e ativista chileno Victor Jara) produzida no Brasil e nos países da América Espanhola durante o período da Guerra Fria. Com prefácio assinado pela cantora e compositora chilena Tita Parra, neta de Violeta Parra, a narrativa focaliza a um só tempo a trajetória da autora e a da canção engajada no continente, que tanto marcou as décadas de 1960 e 1970.

Com a intenção de resgatar o contexto histórico, político e social em que surgiu o cancioneiro dessa época – principalmente a Nueva Canción Latinoamericana –, há mais de dez anos a autora iniciou uma série de entrevistas, pesquisas e viagens pela América Latina e Caribe. Durante o tempo em que esteve em Santiago, ela ficou na casa onde morou a compositora Violeta Parra, autora do clássico Gracias a la vida, gravado por Elis Regina. Neste período, Bruna contou com a colaboração das compositoras chilenas Isabel e Tita Parra – filha e neta de Violeta, respectivamente – para o desenvolvimento da sua pesquisa.

Ao longo dos anos, entrevistou nomes fundamentais para a cultura e a história latino-americana da segunda metade do século XX, a fim de refletir e questionar sobre as questões sociais e históricas do nosso continente. Entre essas figuras, estão o escritor chileno Antonio Skármeta (autor de O carteiro e o poeta), o compositor cubano Silvio Rodriguez, a médica cubana Aleida Guevara – filha do Che –, o Poeta Thiago de Mello, o executivo da indústria fonográfica André Midani e o argentino Fabian Matus – filho da cantora argentina Mercedes Sosa.

Ao expandir a sua pesquisa para todo o território latino-americano e Caribe, a autora explorou a música de intervenção produzida no Brasil durante o governo militar, não se limitando a falar exclusivamente sobre as obras autorais produzidas no país, mas também sobre a colaboração entre brasileiros e artistas de outras partes do território, que resultou em parcerias e gravações históricas. Afinal, foi uma época de grande intercâmbio cultural entre os países, onde Chico Buarque gravou canções de Pablo Milanés, Milton Nascimento gravou Silvio Rodriguez e Violeta Parra – esta última também gravada por Elis Regina. Além disso, a constante presença da cantora argentina Mercedes Sosa no Brasil rendeu uma série de gravações históricas com grandes artistas da nossa MPB.

Ao explorar o tema da censura no Brasil, a autora resgata passagens sobre diversos artistas da MPB, além de citar outros tantos que nem sempre são associados à música de intervenção, como é o caso do sambista Luiz Ayrão. Entre as histórias contadas no livro, estão passagens que envolvem composições de Belchior, Capinam, Carlos Lyra, Vinicius de Moraes. O livro explora também a importância de grupos como Tarancón (2º lugar no Festival dos Festivais de 1985) e Raíces de América (2º lugar no Festival MPB Shell de 1982) na divulgação do repertório da música de protesto no Brasil, e resgata a história do pianista Tenório Jr., que desapareceu durante uma turnê com Vinicius e Toquinho em 1976, em Buenos Aires.

Em uma cativante autobiografia musical de uma mulher latino-americana, nascida no coração do ABC paulista, berço do movimento sindical brasileiro, Bruna Ramos da Fonte realiza de forma magistral seu objetivo de compor um “manifesto de alguém que acredita na arte e na cultura como as grandes ferramentas da revolução”.

A autora vai participar de um bate-papo e de uma sessão de autógrafos na Livraria Leonardo Da Vinci (Avenida Rio Branco, 185, subsolo, Centro, Rio de Janeiro), nesta quinta-feira, 18 de abril, às 18h.

BRUNA RAMOS DA FONTE, nascida em São Bernardo do Campo, em 1991, é jornalista e fotojornalista. Especialista em Direito Internacional e Direitos Humanos (PUC/MG), Direitos Humanos, Gênero e Sexualidade (UAM) e Relações Internacionais (UAM), atua como consultora em Processos Internacionais, Migração e Direitos Humanos desde 2007. No campo da literatura, é autora de diversos títulos como as biografias de Sidney Magal e Roberto Menescal e um romance biográfico sobre Mozart.

APENAS UM MULHER LATINO-AMERICANA: EM BUSCA DA VOZ REVOLUCIONÁRIA

Autora: Bruna Ramos da Fonte

Páginas: 272

Preço: R$ 69,90

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